terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Um olhar sobre o modo de vida amazônico


Uma reflexão dos processos históricos do século XXI e, de forma singular, os impactos da era da globalização, tem propiciado a constatação de alterações significativas no modo de vida das populações amazônicas, marcadas por múltiplas determinações econômicas, sociais, políticas e culturais. Temos sido confrontados com ações inconsistentes e vazias de políticas públicas que não têm priorizado, sobremaneira, a qualidade de vida dos povos da floresta.
A organização dos modos de vida dessas populações tem relação direta com a intervenção dos grandes projetos econômicos que originam políticas públicas intervencionistas e que tem beneficiado muito mais as forças mundiais do que os próprios povos regionais. Esta é uma crítica veemente que é feita e precisa continuar sendo feita pelos movimentos sociais, pela sociedade civil organizada, pelos subalternizados, desfavorecidos, pelos “sem voz” e “sem vez”, pelos que se sentem excluídos, discriminados e alijados do processo de desenvolvimento social. Infelizmente continuamos sendo expectadores e ou atores coadjuvantes que moram numa região que permanece sendo saqueada, devastada e seu povo empobrecido pela exploração econômica decorrente de um planejamento acumulativo deflagrado pelas estruturas do Estado nacional.
A Amazônia constitui área com características, problemas e possibilidades peculiares, e por isso deve ser analisada particularmente. Problemas como os ligados aos processos agrícolas, ao sistema de exploração e especulação fundiária, às questões sociais, ao nível de emprego e aos problemas ambientais, ainda persistem na Amazônia e são avassaladores e complicados. Mas há uma demonstração de que a região amazônica tem desejado a formulação de uma política contrabalançada e coerente de desenvolvimento, de construção de uma sociedade sustentável. Há uma constatação de alguns avanços produzidos pela execução de projetos, nos últimos vinte anos; obviamente que isso não elimina a complexificação e criação de outros e novos problemas.
Qualquer elaboração de políticas de desenvolvimento regional não pode deixar de integrar com eficiência os grupos humanos de áreas prioritárias, suas demandas e inquietações: assegurar a qualidade dos meios de transporte, o funcionamento e a modernização dos veículos de comunicação, o aproveitamento e a potencialização da rede fluvial e da frota de modernas embarcações de grande velocidade; precisamos considerar a inclusão das populações no crescimento econômico e as estratégias de sobrevivência econômica, social, étnica e cultural; não podemos deixar de exigir níveis de empregabilidade e de condições materiais básicas de subsistência. Precisamos realizar pesquisas de campo em áreas previamente selecionadas, tanto para solucionar problemas sócio-econômicos como para conhecer as riquezas naturais e recomendar os meios mais práticos para o máximo aproveitamento sustentável.
Nos estudos que explicam os complexos fatores que afetam a vida do homem em um determinado meio, não podemos priorizar só a dimensão econômica; também é necessário considerar o conjunto de múltiplos aspectos da formação social. Ou seja, viver em um país ou região significa antes de tudo saber como viver: é preciso ajustar-se às condições climáticas, à paisagem, aos recursos disponíveis, aos acidentes climáticos, vencer em suma o desafio da natureza e encontrar o seu próprio estilo de vida naquele ambiente em que se inseriu. Esse desafio ainda não foi respondido pelo homem da Amazônia; este ainda desconhece a magnitude da sociedade regional e que por isso tem estabelecido um diálogo contraditório com as exigências do seu meio.
Qual a compreensão que temos do mundo amazônico, com suas gentes, caracterizado pela pluralidade étnica, dotado de uma paisagem exuberante, com lendas e crendices, com saberes tecnológicos e científicos, com uma cultura típica, produzida por relações e processos dos mais diversos? Como e quando foi que processos e estruturas de organização social e comunitária começaram na Amazônia e por que começaram? Qual o sentido que engendram e mantêm os fenômenos e manifestações sociais, econômicas, políticas, culturais e religiosas na nossa geografia? Quais as características básicas e essenciais da formação dos modos de vida das comunidades amazônicas? Quais as implicações da lógica global capitalista nas relações sociais dos ribeirinhos, das populações indígenas, das populações tradicionais, dos povos da várzea, das populações urbanas? São estas e outras questões que marcam a história da sociedade regional e que suscitam alguns desafios para o homem amazônico. Estas questões podem ser discutidas nos fóruns, nos simpósios, nos congressos científicos, nas assembléias, nas reuniões comunitárias, nos painéis, nas mesas redondas, nas tribos, nos quilombos, nas favelas, nas universidades, nas escolas públicas e privadas, em todos os lugares.
A ciência, com suas várias áreas de conhecimento, e os saberes tradicionais nos ajudarão, por certo, a compreender as peculiaridades da nossa região e entender o por que das coisas, das idéias e das gentes que existem hoje, assim como de coisas, idéias e gentes que não existem mais, e ainda das que, talvez, poderão existir amanhã.
É neste sentido que queremos compreender a complexidade dos lugares que formam a Amazônia, com sua diversidade social e biológica, sua historicidade, os processos de construção de identidade, o governo e as relações de poder, o mundo da produção e do trabalho, os mecanismos de subsistência, a dinâmica das classes sociais que engendram e produzem comportamentos, vontades e desafios. Entender os aspectos originários, influenciadores dos modos diversos de organização da vida na Amazônia, tem sido a preocupação na agenda de muitos.

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