quinta-feira, 8 de janeiro de 2009

Os Problemas Ecológicos e as Relações entre Público e Privado


Por ser considerada uma atividade exclusiva que se exerce diretamente entre os homens sem a mediação das coisas ou da matéria, a ação equivale àquela condição humana que é o pluralismo, pelo fato de que o homem coletivamente vive na terra e habita o mundo. Esta dimensão da ação vem perdendo espaço diante da tendência conformista e homogeneizada da sociedade de massa.
Muitos programas sociais têm praticado a exclusão da possibilidade da ação, tendo em vista que a sociedade tem imposto inúmeras e variadas regras, todas elas objetivando “normalizar” os seus membros. Esta perspectiva invadiu o imaginário social impedindo que o espaço da ação política, da diversidade e da democracia se concretize nos processos sociais vigentes. A ruptura com este paradigma só pode acontecer quando a escolha da perspectiva focalizar mais o “por que” fazer do que “como” fazer, questionando as opções políticas atuais e o próprio conceito de educação vigente que deve estar alicerçada nos princípios da criatividade, inovação e criticidade.
Há uma diferença entre duas esferas de atuação na vida humana: a pública e a privada. Se na vida privada o homem busca proteção e refúgio face ao mundo, é na esfera pública que se localiza a possibilidade da plena realização da condição humana; é nesta esfera, por meio do discurso, que os homens podem agir, dialogando com a pluralidade dos outros homens para transformar a realidade.
O espaço público, além de significar aquilo que pode ser visto e ouvido por todos, designa o que é comum a todos; mas quando esta condição é ameaçada, gerando-se um desinteresse pelo que é comum, a lei do mais forte e a idéia de “levar vantagem em tudo” ganha força e credibilidade. Quando a esfera pública se deteriora, o meio ambiente, por exemplo, torna-se objeto de interesses privados e passa a ser tratado como “terra de ninguém”, onde a responsabilidade pelos prejuízos causados à população dificilmente são evitados ou assumidos por algum responsável. O problema ecológico repõe essa rica cadeia de relações entre o público, o privado e a prática da cidadania.
As lutas ecológicas, que defende a idéia de meio ambiente como um espaço comum, provocam uma crítica ferrenha à forma organizativa da sociedade atual, apresentando um projeto alternativo de organização societária. Dessa forma, a ecologia e as lutas sociais reafirmam que a gestão do meio ambiente é um problema público e um campo de luta política onde se confrontam interesses diferentes e divergentes, ou seja, é indispensável não só compreender, mas também intervir sobre como a qualidade de vida do planeta é ou não garantida pelas decisões políticas.
A luta ecológica revitaliza a abordagem de que o meio ambiente é um espaço comum, e, acima de tudo, um espaço público, onde nos relacionamos com os outros; é um espaço dialético, onde afetamos as ações e somos afetados por elas; onde os aspectos naturais e sociais estão em relações dinâmicas e em constante interação, provocando processos de criação cultural e tecnológica e processos históricos e políticos que mudam a natureza e a sociedade.
Meio ambiente não pode ser visto somente como sinônimo de meio natural. É preciso romper com um determinado tipo de conduta, pensar uma outra lógica para a ação, que não se confunda com a lógica da privacidade e da intimidade.

O Caboclo Amazônico e suas Práticas Religiosas


O homem que vive na Amazônia brasileira tem como principal prática religiosa o catolicismo. Mesmo sendo eminentemente católico, transita no universo das superstições e crendices que fazem parte do seu cotidiano cultural. Esta religiosidade se expressa através da devoção aos santos católicos e da reunião de diferentes comunidades, em momentos específicos, para celebrarem seus padroeiros.
Várias comunidades passam grande parte do ano se preparando para a participação em festas religiosas católicas numa demonstração de fé, de agradecimento por benefícios alcançados e renovação dos pedidos que fazem à imagem do santo protetor.
As novenas, o culto, a missa, a quermesse, as festas religiosas, as procissões não se caracterizam apenas por prestarem homenagens a santos do catolicismo, mas também por servirem de momentos de confraternização coletiva entre várias famílias e comunidades. Certamente são respostas simbólicas às mudanças sociais e ao processo de secularização do sagrado, produzidos pelos novos processos sociais que se realizam na Amazônia; são maneiras de resistir e manter relações e identidades diante de novas práticas e valores sociais.
Mesmo sendo um católico, o caboclo amazônico compartilha de uma concepção de universo impregnada de idéias e crenças oriundas da sua ancestralidade ameríndia. Em várias comunidades amazônicas, a ausência da igreja oficial não impedia que os devotos praticassem sua fé, suas crenças e suas devoções; nem significava que eram anti-religiosos. A própria população responsabilizava-se pelas atividades religiosas; as beatas e os beatos constituíam-se importantes líderes religiosos, devotos, “árbitros religiosos e morais” de suas comunidades correspondentes.
A população vive sua catolicidade ao seu modo, imprimindo suas particularidades teológicas, sociológicas e antropológicas. Acreditam que Deus e Cristo são adorados, apesar da virgem Maria e os santos terem maior evidência na religião local. O culto aos santos e a organização de irmandades religiosas não são típicas e nem exclusivas da religião do caboclo da Amazônia, tendo em vista a difusão dessas instituições em outras áreas brasileiras; tais instituições se revestem de um característico regional: a forte influência ameríndia, revelada em crenças e práticas religiosas dessa origem. Estas crenças se referem aos curupiras, aos anhangás, a cobra-grande, a matinta-perera, os botos e outros. Cada qual apresenta um conteúdo de “verdade”, estão recheados de valores aos olhos de quem os cultuam e os temem; além de outras crenças como os “companheiros do fundo”, as “mães de bicho”, os “bichos visagentos”, a “panema”, a “pajelança”, ou as “rezas”.
Os santos, ao contrário dos bichos visagentos, recebem culto e veneração, e com eles o caboclo estabelece relações através de orações, de promessas e de atos festivos; acredita-se que eles têm a função de proteger a comunidade e o indivíduo. A promessa cria um laço estreito de comprometimento entre o devoto e o santo. As crenças católicas misturam-se às crenças em poderes sobrenaturais e às práticas mágicas de origem nativa.
A Amazônia é uma terra onde existe uma espécie de amalgamação religiosa, onde a cosmovisão do mestiço e do caboclo amazônico foram assim convertendo-se numa intrincada amálgama de ideologia nativa e européia.
Compreender a formação do sistema religioso do caboclo que se estabelece singularmente na Amazônia, os processos que o diferencia etnicamente de outras identidades existentes e como ele interpreta a sua realidade a partir desses modelos conceituais é uma área que precisa ser estudada.